Tu és quem sonhei!


Desde que sou gente me lembro de passar as férias de verão na cottage da ilha do Farol. O meu pai era arquiteto e a mamã escritora e revisora de livros para uma editora Londrina. Todos os momentos lá passados foram de pura felicidade e descoberta da vida, da natureza e do enorme amor que ambos sentiam por mim.

Revezavam-se no trabalho que mantinham para poderem, ora um ora outro, estar comigo. Dávamos grandes mergulhos, andávamos de kayak, percorríamos a ilha a pé, pescávamos e na maioria das vezes ficávamos deitados sobre a areia enquanto me contavam histórias da família, dos meus antepassados, da forma como se conheceram e do quanto ainda se amavam.

Num dos regressos a casa, quis o destino, o azar e o infortúnio, que ambos me fossem levados num brutal acidente do qual escapei ilesa, tendo-me disso lamentado anos a fio. Porque não morrera também? O que me restava agora? Mas eis que cresci. Fiz-me uma mulher. Sou bem-sucedida, profissionalmente, viajei pelo mundo e descobri-me, nunca me esquecendo de onde vim e a razão porque amo com intensidade.

Decidi que compraria a cottage e foi nela, enquanto numa noite de inverno, enroscada no baloiço da varanda e bebendo um cacau quente, te vi aparecer como se de uma visão se tratasse. Levantei-me de mansinho e mesmo num degrau mais alto, senti-te gigante, imponente, de olhar intenso que me desnudou a alma. Falámos noite fora, do que fazíamos ali, o que esperávamos da vida e num fim-de-semana completo ficámos a saber de nós. 

Amámo-nos fisicamente até à exaustão, até não podermos fazer nada mais que não olharmo-nos e sorrirmos perante a coincidência que nos juntara. Descobri os teus lábios, quentes, doces e experientes. Deste-me beijos que me sugaram o ar e me fizeram querer abandonar o corpo de tanto prazer. Não esperei em vão por um corpo que afinal se ajusta ao meu, por carinhos que me recordam que ser mulher também é isto, ter sensações tão intensas que nos permitem viajar sem sair do chão. 

Tu és quem sonhei, mesmo sem rosto. Tu és o homem que me devolveu o amor que antes tive e que hoje sinto que manterei, tal como a casa onde me ensinaram tudo o que sei, sobretudo a amar!

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